O voto de Jefté
Uma jovem muito especial me perguntou sobre uma passagem complicada da Bíblia, e vou tentar responder.
No livro de Juízes está registrado uma passagem que divide opiniões quanto á sua interpretação; É a passagem onde Jefté, um dos juízes que Deus levantou para livrar o povo de Israel do jugo dos Amonitas se vê numa situação difícil; Jefté fez um voto ao Senhor Deus dizendo: "...se totalmente deres os filhos de Amom na minha mão, aquilo que, saindo da porta de minha casa, me sair ao encontro, voltando eu dos filhos de Amom em paz, isso será do Senhor, e o oferecerei em holocausto." (Jz 11; 30-31)
De fato uma lida direta no texto faz-nos entender que após voltar em paz vitorioso da batalha contra os amonitas, Jefté teve a infelicidade de ver que sua única filha lhe saiu ao encontro com adufes e danças, (Jz 11; 34), trazendo para ele grande tristeza (vs 35). E no (vs 39) diz que se cumpriu nela o seu voto, ou seja, ela foi queimada em sacrifício de holocausto ao Senhor, lembrando que holocausto na maioria das passagens bíblicas é queimar o sacrifício inteiro.
Muitos estudiosos da Bíblia concordam com essa interpretação. Mas é preciso levantar algumas questões antes de cravar que isso de fato aconteceu assim.
Primeiramente é preciso constatar que a Bíblia não revela de forma categórica que a menina foi sacrificada, e ela não teria motivos para omitir essa informação, porque por mais chocante que poderia ter sido, a Palavra de Deus não esconderia tal fato. Depois é preciso lembrar que esse episódio ocorre após a lei já ter sido dada ao povo de Israel por intermédio de Moisés, e presume-se que Jefté a conhecia, e segundo a lei era proibido fazer práticas de culto semelhantes aos dos povos que Deus ordenara que Israel expulsasse da terra, (Dt 12;31); "...pois até seus filhos e suas filhas queimaram com fogo aos seus deuses...". Portanto é difícil aceitar que Jefté teria feito um voto pensando que alguma pessoa poderia ser sacrificada ao Senhor Deus de Israel. Vale lembrar que a moça foi chorar durante dois meses a virgindade, e não a sua execução, (vs37). E como o voto não foi cumprido imediatamente, apenas dois meses depois, provavelmente algum sacerdote lembraria Jefté que a lei permitia desfazer um voto feito precipitadamente!!!, (Lv 5; 4-6). Outra coisa importante é questionar; que sacerdote em todo o Israel seria maluco de fazer tal sacrifício? Desobedecer uma ordem expressa de Deus!!! É bem verdade que o livro de Juízes é marcado por uma frase; "...naquele tempo não havia rei em Israel: cada um fazia de acordo com que achava correto aos seus olhos..." (Jz 17; 6). Mesmo assim é difícil aceitar que Jefté queimou a sua própria filha para oferecer ao Senhor.
Mas se não houve sacrifício de morte, o que se cumpriu na moça? O argumento de alguns é que no (vs39), "...e ela não conheceu varão...", é a sugestão de que ela ficou virgem o resto da vida e seria consagrada para servir ao Senhor...mas servir onde? Não havia sacerdócio feminino naquela época em Israel! Então onde ela iria servir para sempre ao Senhor? Não existe uma resposta convincente para essa questão. Outro problema é que no voto Jefté especifica; "...o que me sair ao encontro...", dá a impressão que ele pensava já em uma pessoa, pois em nenhum outro lugar na Bíblia alguém espera que algum animal lhe saia ao encontro. Na verdade, por mais chocados que possamos ficar em admitir que a menina foi realmente sacrificada, é a possibilidade mais bíblica, embora não possa ser considerada completamente a certa.
Existe um outra linha de interpretação, que reforça a idéia de que Jefté ao fazer o voto, sabendo que jamais poderia oferecer um ser humano em holocausto, deixaria as duas possibilidades; sendo animal que lhe saísse ao encontro seria queimado em sacrifício; sendo um ser humano, seria consagrado ao Senhor para servi-lo por toda a vida. "...ou consagrarei ao Senhor, ou oferecerei em holocausto...", (vs 31adaptado), como se fosse uma condicional. Para alguns especialistas o hebraico permite essa interpretação.
São aquelas passagens que só na glória saberemos com certeza o que aconteceu, porque poderemos perguntar diretamente a Deus.
Fato é que precisamos tomar muito cuidado com essa questão de prometer coisas a Deus; "...quando a Deus fizeres algum voto, não tardes em cumpri-lo; porque não se agrada de tolos. O que votares, paga-o. Melhor é que não votes do que votes e não pagues, (Ec 5; 4 e 5).
Deus abençoe.
Muito interessante. Obrigada pela disponibilidade pastor.
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